Lição 06 – Davi: Um casamento real
Prezado(a) professor(a), para ajudá-lo(a) na sua reflexão, e na preparação do seu plano de aula, leia o subsídio da semana. O conteúdo é de autoria de Telma Bueno.
Introdução:
A lição deste domingo tem como ponto de partida o casamento de Davi com Mical, filha do rei Saul. A vida de Davi é para nós uma inspiração em díspares áreas, e não seria diferente no seu ca-samento com a filha do rei. Davi era um pastor, homem do campo, acostumado com as intempéries do tempo, da vida, mas estaria ele preparado para viver na corte, em meio às intrigas palacianas? Será que o jovenzinho pastor que acabara de lutar com um gigante e vencê-lo cairia na conversa astuta de Saul?
A proposta de Saul seria uma oportunidade imperdível para muitos na atualidade. No entanto, o rei, desde o início, tinha em mente um plano contra Davi. Ele acreditava que o jovem belemita seria morto na tentativa de pagar o dote pela noiva. Essa foi uma conspiração macabra capaz de deixar os roteiristas de cinema e séries com inveja (1 Sm 18.20-25). Saul não conseguia enxergar o coração humilde de Davi e o fato de que Deus era com ele.
O filho de Jessé não era ganancioso e nem um oportunista. Ele sabia de onde fora retirado pelo Senhor. No entanto, o ciúme de Saul cegava-o. É isto o que esse sentimento tão nefasto e carnal faz com quem é invejoso: ele tira a visão e rouba a capacidade cognitiva da pessoa.
Quando surgiu a notícia de que Saul estaria à procura de um esposo para uma das suas filhas, Davi já tinha vencido Golias e era um guerreiro reconhecido. A sua humildade, no entanto, que era resultado da presença de Deus na sua vida, fez com que ele demonstrasse uma nítida percepção da sua condição social para estar à altura de um casamento real.
Um noivo humilde:
Uma das virtudes de Davi era a humildade. Essa qualidade foi evidenciada diante da proposta apresentada por Saul a ele: “Eis que Merabe, minha filha mais velha, te darei por mulher; sê-me somente filho valoroso e guerreia as guerras do Senhor” (1 Sm 18.17). Na verdade, a proposta de Saul era uma cilada. Ele desejava matar Davi, mas gostaria que esse ato fosse feito por intermédio dos filisteus (era como se estivesse contratando um “matador de aluguel”).
O que também chama nossa atenção é que Saul não tem escrúpulo algum em usar o nome do Senhor em um plano tão sórdido. Davi conhecia ao Senhor, tinha intimidade com Ele e não cairia tão facilmente nessa cilada. O filho de Jessé não viu em nenhum momento a possibilidade de casar-se com uma das filhas do rei, que, a princípio, seria a mais velha, Merabe, como uma oportunidade para uma ascensão social (1 Sm 18.17).
Quando os empregados de Saul tentaram persuadi-lo falando a respeito da oportunidade de ser genro do rei, Davi diz: “Quem sou eu, e qual é a minha vida e a família de meu pai em Israel, para vir a ser genro do rei?” (1 Sm 18.18). Davi era humilde e realista e não se deslumbrou com a oferta, pois era desprovido de ambição egoísta.
Na atualidade, muitos ficariam deslumbrados com qualquer proposta ou convite semelhante ao que Davi recebeu, pois o narcisismo e a ambição são as marcas de nosso tempo.
Como a Humildade e o Sofrimento São Vistos na Atualidade
O pensamento moderno vê a humildade como demérito, e não virtude. Na atualidade, todos querem ser VIP, receber um tratamento especial, digno de um rei ou rainha, devido ao seu status social. Davi, no entanto, não pensava assim.
Não nos esqueçamos de que nós, discípulos de Cristo, temos que ir na contramão do pensamento deste mundo (Rm 12.2) e sermos como Davi, ou seja, devemos derrubar esses “gigantes”, pois Jesus é nosso maior exemplo de humildade. A vinda dEle a este mundo já nos revelou que o seu Reino seria marcado pela modéstia. O seu nascimento aconteceu num celeiro e, embora seja o Rei dos reis, foi envolto em panos, e o seu berço foi uma manjedoura.
Na Carta aos Filipenses, lemos: “De sorte que haja em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus” (Fp 2.5). Esse texto fala a respeito da humildade de Cristo. Certa vez, o Mestre disse aos seus discípulos: “[…] aprendei de mim, que sou manso e humilde de coração” (Mt 11.29).
Jesus Cristo é o modelo perfeito de humildade, e devemos seguir o seu exemplo. Enquanto esteve exercendo o seu ministério terreno, Ele “não teve por usurpação ser igual a Deus”. Isso significa que nosso Senhor não se apegou aos seus “direitos divinos” e não agiu egoisticamente, mas esvaziou-se da sua glória para assumir a natureza humana e entregar-se em expiação por toda a humanidade.
O que podemos destacar nessa atitude humilde de Jesus é o seu amor por nós. Jesus voluntariamente se humilhou e assumiu as peculiaridades da fragilidade humana por amor a nós. Filipenses 2.7 diz que Ele “aniquilou-se a si mesmo”.
A encarnação de Jesus foi, portanto, a maior prova da sua humildade, pois Ele esvaziou-se a si mesmo e privou-se dos atributos divinos para tomar a forma humana. Ele jamais se despojou da sua divindade no seu estado de humilhação, mas também nunca expressou o sentimento de ser tratado de forma VIP.
Seguir o caminho da humildade não é fácil, assim como a vida cristã, pois é um chamado à renúncia. É preciso renunciar nossas vontades e desejos deste mundo em favor de tesouros eternos nos céus (Lc 9.23; Jo 15.18,19; 17.14-16).
Davi estava sofrendo com a perseguição, e a sua vida não estava nada fácil. Ele estava longe de casa, da sua vida pastoril e enfrentando um encalço implacável por parte de Saul. Davi é um exemplo de que os justos também sofrem.
Precisamos ter a consciência de que “[…] todos os que piamente querem viver em Cristo Jesus padecerão perseguições” (2 Tm 3.12). Seguir a Cristo e tornar-se um discípulo significa viver segundo os padrões do Reino de Deus, e isso nos leva a uma luta constante contra nossa velha natureza e o mundo hostil em que vivemos e que se encontra sob o poder do Maligno (1 Jo 5.19).
As pessoas não querem ser confrontadas e lapidadas por intermédio do sofrimento. Todos querem evitar qualquer tipo de dor, e com isso muitos anunciam um pseudoevangelho em que não há lugar para a renúncia, a dor ou o sofrimento.
Confrontar o sistema mundano com humildade e integridade é um desafio para nós, e temos a certeza de que também foi para Davi (Mt 5.38-48). Foi um desafio bem difícil, talvez pior do que matar o gigante Golias. Depois da luta contra o filisteu, Davi experimenta um novo tempo que exigia desafios maiores: cumprir a vontade de Deus vivendo no palácio, cercado de pessoas, certamente bem-vestidas, cheirosas, porém malvadas e desequilibradas, a começar pelo rei.
Não nos esqueçamos de que somos o sal da terra e a luz do mundo, e isso significa ser humilde e fiel ao Senhor a despeito de qualquer ambiente, por mais hostil que seja (Mt 5.13-16). Muitas vezes o seu desafio será no mundo corporativo; outras vezes, será na vida familiar ou no seu ministério.
Davi estava vivendo em um ambiente hostil e tóxico. Você pode imaginar a vida palaciana, regida por um rei desequilibrado? Deveria ser terrível para um jovem músico e poeta sensível como Davi.
Nós, assim como Davi, também estamos vivendo em um mundo hostil, marcado por uma profunda corrupção moral. Vivemos os dias que antecedem a volta de Cristo, quando o quadro
moral da humanidade, segundo as Escrituras Sagradas, seria bem tenebroso (2 Pe 3.3; 1 Tm 4.1; Jd 17,18).
Paulo chama esses dias de “tempos trabalhosos”. Trata-se de uma era marcada pelo egoísmo, materialismo, arrogância, crueldade e ódio (2 Tm 3.2-4). Assim como Davi, precisamos ir na contramão de nosso tempo e mantermo-nos puros, separados e fiéis a Deus.
Saul tinha como intenção matar Davi e não se importava com o fato de que tivesse de passar por cima dos sentimentos das suas filhas para alcançar o seu intento. A sua crueldade e obsessão por destruir o filho de Jessé contrasta com o amor e a humildade de Davi.
O convite de Saul era, na verdade, uma armadilha, uma tentação. Os servos de Deus, assim como Davi, são ou serão tentados por propostas que parecem boas a princípio, mas que levarão à morte ao fim de tudo. É preciso ter cuidado e não se deslumbrar com qualquer tipo de oferta.
A humildade era uma característica do caráter de Davi. Ele certamente não seria “um homem segundo o coração de Deus” se não tivesse essa marca, pois o Senhor abomina a soberba.
Ao olhar para a vitória que teve sobre Golias e os cânticos entoados para honrá-lo e, agora, a oportunidade de casar-se com a filha de Saul, Davi poderia ser tentado a acreditar de alguma forma que os méritos eram seus. Talvez pudesse crer que os seus talentos foram suficientes para proporcionar a ele tais conquistas.
Davi, entretanto, tinha consciência de que as suas conquistas eram resultado da presença de Deus na sua vida. A humildade não foi momentânea na vida do filho de Jessé, mas foi uma constante na sua trajetória e pode ser observada na sua dedicação ao pastoreio (1 Sm 16.11; Sl 78.70-72) e na sua postura reconhecendo as suas limitações (1 Cr 17.16). Com relação ao casamento com a filha do rei, Davi mostrou humildade deixando claro que não era digno de tal honra (1 Sm 18.18). O que muitos veriam como uma oportunidade de ascensão social e econômica, o homem segundo o coração de Deus repudiava.
Em duas ocasiões, um casamento real foi cogitado. Em primeiro lugar, com Merabe, por ocasião da morte de Golias; depois com Mical, que amava a Davi (v. 20). Nas duas ocasiões, Saul tentara criar uma situação que levasse o belemita à morte (1 Sm 18.17,20-21).
Um Acordo para Casar-se:
Mical aparece pela primeira vez nas Escrituras Sagradas como a filha mais jovem de Saul (1 Sm 14.9), que “amava a Davi” (1 Sm 18.20). A Bíblia, no entanto, não revela os sentimentos de Davi pela jovem, pois os casamentos no Oriente eram arranjados pelas famílias. Até hoje, faz parte da cultura de alguns países as famílias decidirem com quem os seus filhos vão casar-se.
O “amor” não era um requisito para um casamento nos tempos bíblicos. Não estamos tratando aqui de um filme ou série produzidos por Hollywood. Nos tempos bíblicos do Antigo Testamento, o casamento era um acordo familiar, e os jovens não tinham poder de decisão. Segundo os padrões da época, casavam-se primeiro e depois é que vinha o amor.
Paulo, no entanto, traz um ensino inovador para os padrões da sua época: “Vós, maridos, amai vossa mulher, como também Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela” (Ef 5.25). Ele fala a respeito desse sentimento tomando como princípio o amor de Cristo pela Igreja. Temos aqui um amor altruísta, diferentemente de todo romantismo da atualidade
É importante ressaltar que, embora vivamos numa época distinta dos tempos bíblicos, os que pretendem casar-se, não importa a idade, precisam ter o consentimento dos pais e das famílias, pois, quando nos casamos com alguém, também “casamos” com a sua família, e esse é um padrão bíblico. Saul pretendia usar o casamento com um fim espúrio.
Um casamento, seja em qualquer tempo, sem a direção divina pode tornar-se uma cilada. Casamento é algo bíblico e muito sério, tomemos como exemplo o jovem Esaú: um rapaz difícil que fez pouco caso do seu direito de primogenitura, trocando-a por um prato de lentilha. Esse jovem contrariou os seus pais, os conselhos deles, trazendo dor e tristeza para a sua família e para si próprio (Gn 26.34,35).
O amor de uma noiva:
O relato bíblico revela-nos que Mical, a filha mais nova de Saul, amava a Davi (1 Sm 18.20), mas não revela os sentimentos de Davi pela jovem. O amor é um sentimento necessário em um casamento e é diferente da paixão. O Dicionário Houaiss descreve a paixão “como um sentimento, gosto ou amor intenso a ponto de ofuscar a razão”. A paixão não é garantia de que um relacionamento será saudável e duradouro; já o amor é, pois ele não ofusca nossa razão. Numa época em que imperava o modelo patriarcal de família, em que os matrimônios eram arranjos que envolviam política, poder, disputas territoriais, entre outros interesses, a história desses dois jovens certamente nos inspira.
Nesse modelo familiar, o pai era o chefe do clã e tinha poder sobre os filhos, as noras, os netos e os parentes. O patriarca tinha direitos sobre os bens e os descendentes, até direito quanto a vida ou a morte.
O acordo de casamento oferecido por Saul a Davi não tinha nada de romântico e belo. Foi uma jogada sórdida marcada por uma série de estratagemas com a intenção de matar Davi. Tanto com Merabe, a filha mais velha, que foi dada em casamento a outro homem, quanto com Mical. O rei planejou uma tragédia ao seu desafeto, e podemos ver aqui como as mulheres eram desprovidas de direitos.
A Vida das Mulheres no Antigo Testamento:
Mical não tinha direto algum de escolha; aliás, no seu tempo, as mulheres não eram nem mesmo contadas, e os seus nomes não entravam nas genealogias, pois pertenciam aos seus maridos, assim como todos os bens que ele possuía. Elas eram sujeitas aos maridos e aos seus filhos homens depois que estes completavam os seus treze anos. A entrada no Templo só era permitida até ao chamado “pátio das mulheres” ou “dos gentios”.
Até hoje, as mulheres ficam num local reservado para elas junto ao muro do antigo Templo em Jerusalém. Mas as restrições não paravam por aí. Mulheres não podiam frequentar escolas para aprender a Lei ou ser alfabetizadas; o importante era saber cozinhar e realizar os cuidados com a casa.
A sala era um local restrito aos homens; por isso, quando Marta vê a sua irmã na sala aos pés de Jesus aprendendo com Ele, pede ao Mestre para que mande a sua irmã ajudá-la. As mulheres tiveram, no entanto, uma participação especial no ministério de Jesus. O Mestre não era somente o Salvador para elas, mas também aquEle que veio para resgatar a condição social delas, que estava deturpada pelo pecado.
Nos dias de Jesus, era atribuída à mulher uma condição social inferior, e Ele não só quebrou paradigmas em relação às mulheres, como também as ensinou e teve uma amizade respeitosa com elas, como, por exemplo, Marta e Maria. Jesus também libertou Maria Madalena dos poderes de demônios, como também evangelizou a mulher samaritana junto ao poço.
Jesus valorizou as mulheres como ninguém jamais o fez e ainda concedeu a elas o privilégio de poderem contribuir financeiramente para a expansão do Reino.
Homem e mulheres foram criados à semelhança de Deus, e tal verdade é uma prova de que ambos são valiosos para o Senhor. Tudo o que vai contra essa verdade fere os princípios bíblicos. Homens e mulheres são importantes diante de Deus. As Escrituras Sagradas mos-tram, no entanto, que ambos têm funções diferentes (1 Co 11.11,12).
Quanto Valia uma Filha:
Nenhum pai dava a sua filha em casamento sem receber um dote, que era um valor em troca. Para que Davi pudesse casar-se com Mical, o rei não pediu um valor em dinheiro, mas desafiou Davi a matar cem filisteus.
O noivo, surpreendendo o sogro, entrega-lhe o dote (1 Sm 18.25). A atitude ousada e corajosa do futuro genro contribuiu para que se intensificasse a inveja de Saul e o seu ódio mortal para com Davi. Não podemos deixar de ressaltar que a inveja é um sentimento des-trutivo provocado pela insatisfação pessoal a respeito da felicidade e sucesso alheio (Pv 14.30). O propósito do invejoso é destruir ou ignorar o que alguém conquistou, como bem intentava Saul. Esse sentimento é perigoso e contagioso, o que leva o invejoso a
influenciar (contaminar) negativamente outras pessoas (Gn 4.5; 37.11). A inveja é um sentimento pecaminoso e contagiante, uma obra da carne (Gl 5.20,21) e oposta ao amor; por isso, ela não deve ter lugar na vida de um cristão (1 Co 13.4).
Como vimos, a cultura bíblica em relação ao noivado nos tempos bíblicos é muito diferente de nossa cultura. Era um compromisso que só poderia ser dissolvido mediante uma transação legal — na verdade, um divórcio. O motivo para o cancelamento era somente um: o adultério (Dt 22.24).
Que Deus abençoe a sua aula e os seus alunos!
Telma Bueno
Editora da Revista Lições Bíblicas Jovens
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