Lição 7 – Santidade: de dentro para fora
Prezado(a) professor(a), para ajudá-lo(a) na sua reflexão, e na preparação do seu plano de aula, leia o subsídio da semana. O conteúdo é de autoria do pastor Natalino das Neves, comentarista do trimestre.
INTRODUÇÃO
Neste capítulo, conheceremos as origens dos fariseus e escribas, as atribuições e relevância deles para a sociedade judaica da época. Os escribas e fariseus são acusados por Jesus de praticarem uma falsa espiritualidade e santidade de aparência, com base na defesa da tradição dos anciãos. Eles são desmascarados por Jesus nas suas pegadinhas teológicas. Jesus adverte que a santidade ocorre de dentro para fora, e não o contrário.
A Exterioridade de Santidade dos Fariseus e Escribas
O Surgimento dos Fariseus e Escribas
Otzen (2003, pp. 145-146) afirma que Josefo, ao escrever para o público romano, defendia que o judaísmo da época estava subdividido em três “filosofias” ou escolas filosófico-religiosas: os saduceus (apoio da elite, que sofreu alteração significativa devido à relação com o imperialismo no período de 200 a.C. a 70 d.C.), fariseus (apoio popular) e os essênios (partido sacerdotal que buscou o afastamento do Templo e restante do sacerdócio), além de uma quarta representada pelos grupos rebeldes ou os chamados “nacionalistas religiosos”. Otzen (2003, pp. 147-206) classifica os saduceus como pertencentes à elite; os fariseus, ao que seria um grupo intermediário; os nacionalistas e os essênios, aos grupos dos pobres. Os fariseus preferiram priorizar a manutenção do seu status político e garantir os direitos religiosos por meio de uma adaptação parcial ao sistema dominante sem abrir toda a guarda.
Otzen (2003, p. 154) afirma que a formação do movimento farisaico não está totalmente clara; já os essênios e o grupo nacionalista, pelas suas características, apresentam mais proximidade com as ideias apocalípticas. Outra característica interessante no farisaísmo é a sua proximidade com os escribas. Otzen afirma que os escribas eram os “principais ideólogos dos fariseus”.
Souza (2013, pp. 77-81) afirma que a origem dos fariseus, cujos membros eram oriundos de todas os níveis sociais, sobretudo da “classe” média urbana, deu-se na época da decadência do movimento dos assideus — portanto, no início da era dos Macabeus — no século II, durante o período helenístico (Império Grego). Os assideus eram nacionalistas e contra os estrangeiros; porém, na época dos romanos, faziam uma resistência passiva devido à tolerância romana com a religião judaica.
Schubert (1979, p. 57) afirma que tanto os fariseus como os essênios vieram do movimento dos assideus apocalípticos. No entanto, “os essênios radicalizaram as concepções de seus predecessores assideus, os fariseus tornaram-nas mais liberais” (SCHUBERT, 1979, p. 13). Os fariseus e os essênios opuseram-se às atitudes da família hasmoneia quanto ao exercício sacerdotal. Os fariseus não aceitavam a necessidade de lutar pelo poder nacional e conformavam-se “em levar uma vida privada de rigorosa observância da lei do Sinai” (PIXLEY, 1989, p. 117).
Escribas e Fariseus Consideravam-se os Verdadeiros Mestres (Mt 23.2-22)
Jesus afirma que os escribas e fariseus estavam assentados na cadeira de Moisés (Mt 23.2), dando a entender que eram detentores do conhecimento sobre a Lei Mosaica, ou seja, oficiais de interpretação de Moisés, tidos como herdeiros da autoridade de Moisés para ensinar. Jesus não nega a capacidade intelectual deles, inclusive afirma que eles têm o seu devido lugar como mestres. Ele recomenda que escutassem os seus ensinos, mas não fizessem o que eles faziam, pois diziam uma coisa na teoria e faziam outra na prática (v. 3). Eles colocavam pesados jugos sobre os ombros do povo com base nas suas interpretações da Lei sem preocupar-se em ajudá-los a carregar esses fardos; antes, cobravam o cumprimento com base em pretensa santidade (v. 4).
Esses pretensos mestres usavam largos filactérios e franjas de vestidos alargados com o intuito de chamar atenção para serem vistos como homens santos (v. 5). Os filactérios são caixinhas de couro com quatro tiras de pergaminho, com escritos de textos bíblicos (Êx 13.1-10; Êx 13.11-16; Dt 6.4-9; Dt 11.13-21). Os fariseus tomavam como literal as orientações do texto bíblico de colocar como “sinal na tua mão”, “testeiras entre os teus olhos” e “frontais entre os teus olhos”.
Jesus ridiculariza essa preocupação minuciosa, vendida como virtudes e exemplos de santidade, para expressar santidade com base na exterioridade. Não bastasse isso, eles amavam os primeiros lugares nas ceias, buscavam os lugares de honra nas ocasiões formais e solenes. Buscavam as primeiras cadeiras nas sinagogas e as saudações nas praças para destaque e proeminência (vv. 6, 7). Jesus adverte os discípulos para não buscarem esses privilégios e serem reconhecidos como mestres/rabis. Os próprios discípulos, oriundos dessa cultura, também tiveram comportamentos semelhantes (Lc 22.24; Jo 13.2-11).
Jesus usa a temível palavra “ai”: “Mas ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas!”, lembrando os “ais” proféticos usados em tom de condenação de algo abominável ao Senhor, principalmente de injustiça social. Ele usa nos versículos 13-16, 23, 25, 27 e 29. Os escribas e fariseus estavam “fechando aos homens o Reino dos céus” (v. 14), com a sua espiritualidade exteriorizada disfarçada. Robertson (2016, p. 255) afirma que, “pelo seu ensino, esses guardas do reino obscureceram o caminho para a vida. É uma tragédia pensar que os pregadores e ensinadores do Reino de Deus podem trancar a porta para os que tentam entrar”.
A reprimenda de Jesus continua (vv. 13-24) em vigor em nossos dias. Há pessoas que, em nome de uma santidade falsa e exteriorizada, como os escribas e fariseus ,“coam um mosquito”, mas “engolem um camelo”. São pessoas que querem intitular-se detentores e defensores da verdade, os verdadeiros mestres e santos, mas que, na realidade, estão condenados, e muitos os estão seguindo. “Ai” desses hipócritas da pós-modernidade.
Jesus Repreende a Exterioridade da Santidade dos Fariseus (Mt 23.25-28)
Jesus aplica mais um “ai” aos escribas e fariseus hipócritas (v. 25), que viviam de aparência de santidade exterior por meio de certa purificação mecânica e rotineira, enquanto afirma que o interior deles estava sujo e contaminado. Eles agiam como se Deus fosse cego e avistasse somente o exterior, mas na realidade eles que eram cegos e não conheciam Deus de verdade. Eles são os ateus práticos, agem como se Deus não existisse. O exterior deve expressar o que temos em nosso interior. Não tem como simular diante de Deus. Perante a sociedade até é possível, mas qual o proveito?
Jesus também faz uma crítica ao comportamento hipócrita dos escribas e fariseus quanto às regras de purificação, que ressaltava certa “santificação” à mesa. Ele adverte: “Pois que limpais o exterior do copo e do prato, mas o interior está cheio de rapina e de iniquidade” (v. 25). As regras de purificação, a separação do puro do impuro conforme a cultura judaica, foram decisivas para formatar a reunião à mesa entre os judeus. Também serviram como pretexto para impedimento natural de pessoas tidas como impuras por um grupo de religiosos hipócritas compartilharem da mesma mesa. Isso ainda acontecia entre os próprios discípulos de Jesus, como vimos no capítulo 2 deste livro o episódio registrado por Paulo em Gálatas 2.11-14. Quando ele estava servindo a igreja em Antioquia, uma igreja inclusivista que acolhia tanto a judeus como a gentios convertidos ao cristianismo, todos comiam na mesa em harmonia, tanto os irmãos judeus quanto os irmãos gentios, inclusive o apóstolo Pedro. No entanto, quando chegaram alguns irmãos da parte de Tiago, irmão de Jesus e líder da igreja em Jerusalém, Pedro, por medo, cautelosamente recuou e deixou o máximo de distância possível entre si e os seus amigos não judeus. Esse foi um comportamento de aparência e camuflado, condenado por Paulo e por Cristo.
É por isso que Jesus condena as atitudes dos escribas e fariseus. Eles, que eram tidos como santos, uma elite de santidade dentre os judeus, viviam de aparência, enquanto interiormente estavam “cheios de hipocrisia e iniquidade” (v. 28). Dessa forma, fica evidente que a santidade que Deus quer não é a parte complicada e cheia de regras, mas a que realmente faz diferença no dia a dia, na simplicidade e humildade de coração que visa o bem do próximo e agrada a Deus, o Senhor.
A Exterioridade de Santidade e a Prática da Injustiça
Os Escribas e Fariseus Faziam Acusações Injustas (Mt 15.1,2)
Os escribas e os fariseus constantemente observavam as atitudes de Jesus e os seus discípulos com o intuito de acusarem-nos por alguma falha. São atitudes hipócritas de pessoas que se julgam religiosas e com autoridade para julgar as demais. Essas pessoas geralmente atentam para questões secundárias e que não têm impacto significativo na vida espiritual. O que querem, na realidade, é demonstrar serem mais santas e, portanto, com mais autoridade “outorgada por Deus” para comandar ou manipular a fé das pessoas.
Jesus e os seus discípulos estavam na terra de Genesaré mantendo as suas atividades ministeriais como de costume. Quando chegaram ao local e as pessoas ficaram sabendo, trouxeram os enfermos de todas as localidades próximas (Mt 14.34). Enquanto isso, alguns escribas e fariseus chegam de Jerusalém para observá-los e acharem algo para acusá-los; queriam achar algo que comprometesse a moral ou integridade de Jesus e dos seus discípulos. Então, percebem que os discípulos de Jesus comiam sem lavar as mãos. No entanto, o que os incomodava não era a falta de higiene, mas, sim, a questão cerimonial. Na realidade, a Torá previa alguns procedimentos de questão de pureza ritual (Lv 11-15; Nm 5.1-4). Todavia, a questão levantada pelos falsos religiosos não constava na Torá, mas, sim, na tradição dos anciãos. Segundo Bock (2006, p. 206), “[…] eles não comiam sem lavar as mãos nem voltavam do mercado sem realizar lavagem de purificação. Eles também lavavam os copos, potes e vasilhas de bronze. Muitas dessas práticas são registradas em detalhes na Mishná (m. Yadayim 1.1-2.4; m. Toharot)”. A Mishná era um tipo de interpretação da própria Torá, segundo as tradições de doutores da Lei. O texto paralelo de Marcos (Mc 7.1-23) traz mais detalhes desse episódio.
Assim, o que incomodava os visitantes era, na realidade, algo que eles próprios haviam adicionados à Lei Mosaica de forma interpretativa.
Veja como é séria essa atitude: pessoas que se achavam qualificadas para acrescentar o que Deus havia prescrito como se Ele tivesse esquecido algo importante e eles estivessem “corrigindo” a falha dEle; logo, eles achavam-se professores de Deus.
Desse modo, os escribas e fariseus acusavam Jesus e os seus discípulos injustamente, pois eram acréscimos humanos que eles tinham por hábito cobrar dos judeus, como forma de manipulá-los por meio de suposta santidade. Infelizmente, a prática desses judeus é mais comum do que se imagina no meio evangélico. Atitudes hipócritas de religiosos, que vivem de aparências. Devemos estar atentos para não sermos praticantes de injustiça com nossos irmãos. Devemos ficar mais preocupados com nossa vida espiritual, manter sempre a comunhão com Deus e a santidade e estar preparados para encontrarmos com o Senhor a qualquer momento.
Jesus Demonstra que os Acusadores Eram os Transgressores (Mt 15.2-6)
Os hipócritas acusavam a Jesus usando os seus mandamentos de pureza criada por homens. Jesus em Marcos 7.7 chama esses procedimentos requeridos de “mandamentos de homens”. Os judeus sabiam que os rituais requeridos por eles, como lavar as mãos, não se encontravam nas Escrituras, mas, sim, nas interpretações dos anciãos, recolhidas do Talmude. Não há problemas quando povos preservam certas questões culturais e tradições. Eles, no entanto, acusavam a transgressão de procedimentos das suas tradições como se fossem as pessoas mais honestas e puras. Jesus, todavia, escancara a hipocrisia religiosa deles.
O Evangelho de Marcos traz mais detalhes do que Mateus sobre esse episódio, porque, ao que tudo indica, os destinatários deste último eram conhecedores da Lei e das tradições judaicas e, portanto, não precisavam de detalhes. Em Marcos 7.9-13, Jesus desmascara os religiosos judaicos afirmando: “Bem invalidais o mandamento de Deus para guardardes a vossa tradição”. Jesus cita a Lei Mosaica quando diz que os filhos deveriam honrar pai e mãe (quinto mandamento), cuja transgressão era digna de morte. Acontece que eles, para não atenderem às necessidades dos seus pais, alegavam que o bem que possuíam era Corbã. Marcos explica sobre essa lei, que, uma vez declarada como oferta ao Senhor, não poderia ser usada. Jesus acusa-os de usarem a Lei para não honrarem os pais nas suas necessidades. Portanto: “[…] invalidando, assim, a palavra de Deus pela vossa tradição, que vós ordenastes” (Mc 7.13).
Barros (1999, p. 87), ao analisar o texto em referência, adverte que “o importante é a justiça, a veracidade nas relações humanas e o que é impuro e toda a maldade que se faz contra o outro”. Os judeus estavam como que cegos pela sua santidade hipócrita. A resposta de Jesus serve não somente para eles, como também a todas as pessoas que “[…] se deixam prender pela letra da Lei, sem perceber o espírito que ela quer expressar”. Assim, os acusadores dos discípulos (escribas e fariseus) eram os verdadeiros transgressores da Lei de Deus e cobravam de Jesus e os seus discípulos a transgressão das suas leis humanas. Esse episódio também serve para demonstrar que o Senhor está atento à maneira como os idosos têm sido tratados pelos seus familiares, sendo esse comportamento também uma característica de quem é santo.
A Exterioridade da Santidade e a Cegueira Espiritual (Mt 15.10-20)
A Cegueira Espiritual dos Escribas e Fariseus (vv. 10-14)
Jesus não se intimidou diante dos fariseus e dos escribas. Ele exortou-os de forma segura e eficaz, chamando-os de cegos e condutores de cegos, já que se dedicavam tanto a estudar os escritos de interpretações humanas que passaram a deixar de lado a fonte principal: a Lei de Deus. Os escribas e fariseus apegavam-se tanto às questões secundárias e irrelevantes, focando a sua atenção tão firme nelas, que se privavam de ver as primárias e que, de fato, importavam para Deus, o Senhor. Dessa forma, eram como cegos por não enxergarem as suas condutas hipócritas. Eles não conseguiam enxergar o que Jesus estava ensinando. Devido à cegueira espiritual, os judeus escandalizavam-se com os ensinos de Jesus. O orgulho e a mesquinhez conduziam as suas vidas, e não a luz de Deus, como eles mesmos afirmavam. O cristão deve tomar cuidado para não cair no mesmo processo de cegueira, viver de caprichos, pois eles têm vida curta.
Os escribas e fariseus não conseguiam enxergar que o mal estava no interior das pessoas. Paulo também chama os judeus de cegos (Rm 2.19). Ele afirma que os judeus se achavam em condições de conduzir os gentios, considerando-os cegos espirituais. O apóstolo, todavia, assevera que eles também eram cegos e não estavam credenciados para conduzir ninguém. No sentido espiritual, quem tem a visão deve compadecer-se de quem não tem e apontar a solução para o problema, que é Cristo. Paulo aponta a evidência da cegueira dos judeus, bem como o seu comportamento hipócrita. Eles ensinavam a Lei, mas não a praticavam. A atitude judaica faz lembrar o ditado popular “faz o que eu mando, mas não faça o que eu faço”. O que os judeus faziam bem era julgar os gentios (NEVES, 2015, pp. 35, 36).
O apóstolo Paulo somente ratifica o que Mateus registra entre o confronto de Jesus e os judeus. Talvez o apóstolo tivesse conhecimento desses confrontos, por ele também fazer parte desse grupo. Ele era um cego como eles, mas passou a enxergar bem o caminho que conduz para a vida santa e eterna com Deus depois de encontrar a luz no caminho de Damasco. Deixou de buscar santidade na exterioridade para buscar no seu interior e no interior das pessoas.
Que Deus abençoe sua aula!
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